Até 1997 vigorou no Brasil o Decreto-lei 3.688/41, que tipificava o delito do porte ilegal de armas de fogo como contravenção penal. Porém, pequena importância que se dava ao uso de armas de fogo e a aplicação de penas insignificantes diante da conduta geradora de grande intranqüilidade social, urgia tomada de medidas condizentes com a gravidade que representava.
Em fevereiro de 1997 entrou em vigor a Lei 9.437 criminalizando condutas e lhes aplicando penas mais severas. A mudança da legislação deu-se insipiente à realidade brasileira, uma vez que, mais de 80% dos crimes eram cometidos por armas de fogo. Foi neste ano que apareceram os primeiros movimentos pró-desarmamento no Brasil e o controle de armas de fogo começou a entrar na pauta de preocupações nacional. Os movimentos não pararam. Organizações passaram a realizar eventos e atos públicos chamando a atenção da população brasileira. Somando-se a isso, os dados e pesquisas que apareciam mostravam relação direta entre o fácil acesso às armas de fogo e o aumento do número de homicídios, comprovando que quanto mais armas em circulação, mais morte.
Em junho de 2003, foi organizada uma Marcha Silenciosa, com sapatos de vítimas de armas de fogo, em frente ao Congresso Nacional. Este fato chamou bastante atenção da mídia e da opinião pública. Os legisladores tomaram para si o tema e criaram uma comissão mista, com deputados federais e senadores para formular uma nova lei. Esta comissão analisou todos os projetos que falavam sobre o tema nas duas casas e reescreveram uma lei conjunta: o Estatuto do Desarmamento.
Em 23 de outubro de 2005 um referendo, sobre a proibição da comercialização de armas de fogo e munições, não permitiu que o artigo35 do Estatuto do Desarmamento entrasse em vigor. Tal artigo apresentava a seguinte redação:
"art. 35 - É proibida a comercialização de arma de fogo e munição em todo o território nacional, salvo para as entidades previstas no art. 6º desta Lei".
O referendo estava previsto e tinha, inclusive, data marcada no próprio Estatuto do Desarmamento. Pela gravidade do assunto, a necessidade de submeter o artigo 35 a um referendo já havia sido constatada durante o projeto e desenvolvimento da lei. A sua realização foi promulgada pelo Senado Federal a 7 de julho de 2005 pelo Decreto Legislativo n° 780.
No artigo 2º deste Decreto ficava estipulado que a consulta popular seria feita com a seguinte questão: "O comércio de armas de fogo e munição deve ser proibido no Brasil?"
Os eleitores puderam optar pela resposta "sim" ou "não", pelo voto em branco ou pelo voto nulo.
Diversas campanhas, contra e a favor da proibição da comercialização foram realizadas. Diferentes grupos sociais se posicionaram a favor da não comercialização, mas ao final os cidadãos pátrios decidiram pela não proibição da comercialização das armas de fogo no Brasil.
Os defensores de uma e outra campanha justificavam suas teses em correntes doutrinárias, experiências em diversos países do mundo, razões sociológicas e até mesmo religiosas.
A tese que convenceu o eleitorado, apoiou-se em observações de estatísticas mundiais, segundo as quais não seria possível associar a redução do número de mortes por armas de fogo à proibição da comercialização das armas e munições e em doutrina de excelência, tal como a seguinte citação a seguir:
"As leis que proíbem o porte de armas são leis de tal natureza; elas desarmam somente os não inclinados nem determinados aos delitos; enquanto aqueles que têm coragem de violar as leis mais sagradas da humanidade e as mais importantes do código, como as menores e puramente arbitrárias, cujas contravenções devem ser tão fáceis e impunes, e cuja precisa execução tira a liberdade pessoal, caríssima ao legislador esclarecido, e submete os inocentes a todas as vicissitudes dos réus? Estas leis pioram as condições dos assaltados, melhorando a dos assaltantes; não diminuem os homicídios, mas os aumentam, porque é maior a segurança em assaltar os desarmados do que os armados.”
A idéia transmitida pelo autor soou tal como uma profecia e um século depois surgia a Ku Klux Klan, com o objetivo de desarmar os negros após a guerra civil americana (na qual eles conseguiram armas e aprenderam a lutar). E ainda, na primeira metade do século XX, Adolf Hitler desarmou os judeus antes de começar a exterminá-los. Um povo desarmado é mais fácil de ser controlado.
Mais importante que a não comercialização é o controle. E quanto a isso, cabe salientar que a obrigatoriedade do registro, prevista no Estatuto do Desarmamento, dá um grande passo para o controle das armas de fogo. Em tese, quem possui arma de fogo registrada, terá maior responsabilidade com o seu uso.
Nenhum comentário:
Postar um comentário